Minha camiseta que tem um buraco

Eu tenho uma camiseta rosa, e desbotada, que tem um buraco que ninguém, vez alguma, notou. Se notou, nunca falou.

Eu a uso de vez em quando. Sim, poucas vezes, e o motivo é esse mesmo, o de não contribuir para o aumento do buraco.

Não sei quanto tempo faz que a tenho, mas sei que faz muito. Isto me fez lembrar-me de um amigo que tem camisetas, e outras coisas, por diversos anos. Uma vez fui ao seu apartamento de manhã – morávamos no mesmo prédio, e ele ainda mora lá – e estava com uma camiseta com a qual tinha dormido: uma espécie de camiseta pijama; sabe? Havia vários buracos nela. Eu comecei a rir.

– O que foi? – ele parou de falar o que estava falando, querendo rir também, mas sem saber o que estava acontecendo.

– Faz quanto tempo que você tem esta camiseta? – ri mais.

– Dezessete anos, acho.

Então rimos mais e bastante.

Mas voltando à minha, ela me faz sentir-me bonito, apesar do buraco. Ou talvez seja esse buraco, que me leva a cuidados maiores com ela, como se toda rara vez que a uso funcionasse como um momento único, que me faz crer nisso? Não sei. Eu insisto: ela me faz gostar dela; e sua cor, ah, sua cor me encanta, me faz ficar fotogênico, me faz sentir-me jovial, moderno, e secretamente abusado por mantê-la com a pequena abertura que, às vezes, não me lembro se está atrás, na frente ou em um dos lados.

Ela me faz sentir-me, mesmo que só para os meus olhos e nem estimule elogios, mais belo, fuça a minha vaidade, me permite sair com ela, dando ignição à vontade de eu parecer só eu.

Eu gosto disso.